[...] a Justiça continuou e continua a morrer todos os dias. Agora mesmo, neste
instante em que vos falo, longe ou aqui ao lado, à porta da nossa casa, alguém
a está matando. De cada vez que morre, é como se afinal nunca tivesse existido
para aqueles que nela tinham confiado, para aqueles que dela esperavam o que da
Justiça todos temos o direito de esperar: justiça, simplesmente justiça. Não a
que se envolve em túnicas de teatro e nos confunde com flores de vã retórica
judicialista, não a que permitiu que lhe vendassem os olhos e viciassem os
pesos da balança, não a da espada que sempre corta mais para um lado que para o
outro, mas uma justiça pedestre, uma justiça companheira quotidiana dos homens,
uma justiça para quem o justo seria o mais exato e rigoroso sinônimo do ético,
uma justiça que chegasse a ser tão indispensável à felicidade do espírito como
indispensável à vida é o alimento do corpo [...]
(José de Sousa Saramago, escritor, argumentista, teatrólogo, ensaísta, jornalista, dramaturgo, contista, romancista, poeta e pensador português, 1922-2010)
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